sexta-feira, 29 de abril de 2022

Lisboa 5L e Livremente

Para quem ainda não ouviu falar, vai decorrer de 4 a 8 de maio o Lisboa 5L, um Festival Internacional de Literatura e Língua Portuguesa. Terá lançamentos, mesas de autor, livrarias de rua, etc. Podem saber mais aqui: Lisboa 5L – Agenda Digital 5L.

Outro evento que está a decorrer agora e tem menos visibilidade é o Livremente, um encontro literário organizado pela Junta de Freguesia da Misericórdia. Podem ver aqui o programa: Livremente 2022.

quarta-feira, 27 de abril de 2022

O Casal do Aeroporto


Este foi difícil.

A versão original ficou muitíssimo melhor, odeio a rigidez do número de sílabas.

Foi-me impossível não usar a ideia do professor, mas concedo todo o crédito.

Versão Original

— Foi o vento, que seca. Não pude descolar.
Ele acende um cigarro.
Ela esfrega o pulso.
— Não te preocupes, fizeste bem em ligar.

Trocaram palavras vazias.
Ele lembrou-se de assistirem à Eurovisão.
Ela de um sexo maior do que pele e emoção,
E que a satisfazia.

Os seus olhos tocaram-se
As suas mãos, não.
Deixaram-se...

Sem se deixar.
— É tarde, preciso de ir.
— Fica bem. Mande-me mensagem quando aterrar.

Versão soneto rígido

— Foi o vento. Não pude descolar.
Seco, ele acende um cigarro.
Sem jeito, ela esfrega o pulso.
— De nada. Fizeste bem em ligar.

Juntos, trocaram palavras simples.
Ele lembrou-se do anel de zircão.
Ela de sexo, pele e emoção,
De acordar sem se sentir  reles.

Ali, os seus olhos tocaram-se
Mas algures, as suas mãos não.
Perdidos e tristes, deixaram-se...

Mas, na verdade, sem se deixar.
Ele diz. — É tarde preciso de ir
— Mande mensagem quando aterrar

terça-feira, 26 de abril de 2022

"Os Restos" | Um Soneto em Processo

Os Restos

Crepuscular Lídia de alma soprano
Frémito de céu, arisca alvorada
Uma mais tão só e desventurada
Fazendo-se ao horizonte o engano

Vertendo no leito ilusão malhada
Dos idos trejeitos de Marciano
Tal moça aguçada lancina o dano
Em feito de fel rastro de passada

Se é (cl)amar a fundo travar má sorte
Cisma Marciano em dó vespertino
Gozando a lembrança do terno corte

Sondada epiderme de (ó)dor cimbalino
Tropeço lampejo de paixão desnorte
Desfaz-se Lídia em rumor de destino


Jéssica L. Pires
(Versão Final)





(A)mar a mártir


Crepúsculo em Lídia de alma soprano
Frémito de céu, fugida alvorada
Mais uma tão só e desventurada
Quebrando no horizonte o engano

Vertida no leito ilusão malhada
Dos idos trejeitos de Marciano
A alma resseca já findo um ano
Em quem faz do fel lugar de passagem

(Pois se amar a fundo não trava a morte
Mais sacro o sadio credo matutino 
Urde de lirismo o abandono à sorte)

Soldado epiderme de tom cimbalino
Sem conhecer onde firmava a sorte
Desfez sua Lídia em parco destino


(Uma das versões intermédias)





Lídia ida

Lídia-luz voz de soprano
Embebida de alvorada
Moça só, desventurada
Fez-se à noite no engano

Pele e alma couraçada
Partiu rumo a Marciano
A galope posto um ano
Febre e fogo na passada

Que o silêncio alcaçuz
Na palavra e no andar
Talha sombra em Lídia-luz

E não há como esperar
Quando o som da sua cruz
É sonata ao luar


(Versão inicial)

segunda-feira, 25 de abril de 2022

Soneto

Versão final


Quando vem de súbito aquela dor
já sabemos que é daquele grande mal,
o que tem um não sei quê de animal,
eco da memória que nos traz calor.

Vem dos confins da nossa alma, num clamor.
Materializa-se num ato carnal,
não tem mesmo nada de racional.
Vem sem nenhum aviso, cheio de fervor.

É aquele fogo que arde sem se ver,
um pulsar que jamais será esquecido,
um imparável vaivém de enlouquecer.

Será, para sempre, um bem achado,
algo que nunca vai desaparecer,
por mais que te sintas sempre perdido...

Versão intermédia

(a primeira foi apagada no próprio processo de reescrita)





Versão final manuscrita

(tem uma variante no penúltimo verso)

domingo, 24 de abril de 2022

Soneto


Gonçalo Dias

Versão Inicial

 

No tempo de outrora, naquele lugar,

Senti um súbito desejo de ser mais.

Mais que esses que chegam a ser demais,

Sem nunca esse estado alcançar.

 

Procurei.... Procurei em partes tais

Que na ânsia de o segredo desvendar,

Fiquei preso, apenas a vislumbrar...

E pensei que seriam os esforços finais. 

 

Ao procurar estava preso, encalhado,

Nada naquele momento mudou. 

Eu, no meu espírito sempre: cansado.

 

Porém, na noite em que a busca cessou,

O meu coração despedaçado...

O mais que procurava finalmente encontrou.

 

Versão Intermédia

 

No tempo de outrora, noutro lugar,

Senti um súbito desejo de ser mais.

Mais que aqueles que são demais

Sem nunca tal estado alcançar.

 

Procurei.... Procurei em partes tais,

Que na ânsia de o segredo desvendar

Fiquei preso, apenas a vislumbrar...

E pensei que seriam as diligências finais. 

 

Ao procurar estava cativo, encarcerado

Nada naquele momento mudou. 

Eu, no meu espírito sempre: estafado.

 

Porém, na noite em que a busca cessou

O meu coração despedaçado...

O mais que procurava finalmente encontrou.

 

Versão Final

 

No tempo de outrora, noutro lugar,

Senti um brusco desejo de ser mais.

Mais que aqueles homens que são demais

Sem nunca tal condição conquistar.

 

Procurei.... Procurei em partes tais,

Que na ânsia de o segredo desvendar

Fiquei preso, apenas a vislumbrar...

Seriam as diligências finais?

 

No esforço achei-me encarcerado,

Nada naquele momento mudou. 

Eu, no meu espírito sempre: estafado.

 

Porém, na noite em que a busca cessou,

O meu coração despedaçado...

O mais que procurava encontrou.

sexta-feira, 22 de abril de 2022

Versões do Soneto

 O COELHINHO ANSIOSO

De Olavo Rodrigues

Versão I

Eu sou um coelhinho saltitão,

Que de tanto pular 

E de tanto observar 

Tenho sempre na boca o coração.


O raposo Gastão

Não para de me emboscar 

Fico sempre a recear

E não consigo viver são.


Ai, que ele me caça!

Vi um vulto nos arbustos

Não sei o que faça.


Um coelho não descansa dois minutos

Há sempre uma trapaça

E só sobrevivem os argutos.


Versão II

Sou um coelhinho saltitão

E de tanto pular 

De tanto observar

Tenho sempre na boca o coração.


O raposo Gastão

Não para de me emboscar

Receio sempre quinar 

E não consigo viver são.


Ai, que ele me caça!

Vi um vulto nos arbustos 

Não sei o que faça!


Não se descansa nem dois minutos

Visto que há sempre uma trapaça

E só sobrevivem os mais argutos.


Versão III

Eu sou um coelhinho saltitão

Passo muito tempo a pular 

E mais ainda a escutar, 

Vindo-me à boca o coração.


O maldito do raposo Gastão

Nunca para de me emboscar 

Meu medo não cessa de gritar

E não é possível viver são.


Ai, que ele me caça!

Vi um vulto nos arbustos 

Não sei o que faça!


Não descanso nem dois minutos,

Visto que há sempre uma trapaça

E só sobrevivem os mais argutos.

quarta-feira, 20 de abril de 2022

Adequação/inadequação: que equação?

 Um editor é uma alcoviteira a matchmaker, uma casamenteira. Alguém cuja profissão é marcar encontros, prestar um date service. Há um texto que pprocura um leitor, e há um leitor certo para aquele texto. Um livro de poesia procura poucos 'leitores certos', um romance de aeroporto procura um milhão de leitores.


Agora dá-se o caso de editores desastrosos que falham sempre no casamento. As capas erradas, as tiragens erradas, a paginação errada, a tradução errada, a campanha errada...

Um exemplo cómico e fácil é o dos amadores que, no Youtube, colocam um diaporama de imagens bonitas a acompanhar uma canção. Como é a título gracioso não critiquemos muito, mas são um bom meio de percebermos como a inadequação pode ser desastrosa.

Por outro lado, haverá quem goste...

Este caso aqui - de uma canção de Chico Buarque - é engraçado. A canção é sobre a aceitação da diferença, a velha história de sacrifício, oportunismo e ingratidão, bem como a diferença entre moralismo hipócrita e integridade individual.Faz parte da Ópera do Bom Malandro, uma peça de Chico a partir da Ópera dos Três Vinténs de Brecht e Kurt Weil.

Infelizmente, o editor do vídeo não achou assim. Mas, felizmente para nós, ajuda-nos a compreender o princípio da adequação.

sexta-feira, 8 de abril de 2022

A guerra e a edição

Vale a pena ver como o mundo editorial  (e, num plano mais lato, cultural) lida com a guerra e o apoio à Ucrânia.

Tudo é comunicação, tudo é trabalho, tudo é edição.

Algumas entradas: 

https://www.theguardian.com/culture/2022/apr/08/how-ukrainian-writers-and-artists-are-responding-to-the-war

https://publishingperspectives.com/2022/03/european-publishers-welcome-the-ukrainian-association-as-special-guest/

https://www.publishersweekly.com/pw/by-topic/international/trade-shows/article/88853-bologna-2022-ukrainian-children-s-publishers-share-harrowing-stories.html


https://www.theguardian.com/world/2022/apr/16/zelenskiy-ukraine-war-writers-journalists


sexta-feira, 1 de abril de 2022

Calinadas

« As pessoas divertem-se muito a descobrir erros nos jornais, por isso gostava de lembrar que os primeiros a ser dispensados, muito antes de...